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quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014, 3h35

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Brasil leva lei agrícola americana à OMC

BRASÍLIA – O Brasil vai pedir à Organização Mundial do Comércio (OMC) a abertura de um painel, com comitê de arbitragem, para verificar se a nova lei agrícola americana (Farm Bill) ainda mantém subsídios ilegais repassados aos produtores de algodão dos Estados Unidos. Com isso, a retaliação aos EUA autorizada pela OMC ao dar ganho […]

BRASÍLIA – O Brasil vai pedir à Organização Mundial do Comércio (OMC) a abertura de um painel, com comitê de arbitragem, para verificar se a nova lei agrícola americana (Farm Bill) ainda mantém subsídios ilegais repassados aos produtores de algodão dos Estados Unidos. Com isso, a retaliação aos EUA autorizada pela OMC ao dar ganho de causa ao governo e a cotonicultores brasileiros, em 2010, no valor de US$ 830 milhões, continua suspensa.

— A questão da retaliação está sobre a mesa, mas neste momento o importante será verificar se a nova lei agrícola americana responde ou não às necessidades que foram estabelecidas pelo contencioso na área de algodão — disse o ministro das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo, após participar, nesta quarta-feira, de reunião da Câmara de Comércio Exterior (Camex).

Em vez de subsídios, seguro

A provável abertura de um painel pelo Brasil foi antecipada pelo GLOBO há dez dias. Na nova legislação aprovada pelo Congresso dos EUA, o programa de subsídios condenados pela OMC foi substituído por um seguro agrícola, o Stacked Income Protection Plan (Stax). A ideia é verificar se esse seguro está ou não de acordo com as normas internacionais, explicou um técnico do governo.

Pelo texto da chamada Farm Bill, o seguro usado para substituir o pagamento direto aos produtores de algodão cobre de 70\% a 90\% das perdas dos agricultores. O governo americano também pode subsidiar 80\% da contratação do Stax.

"Análise preliminar realizada pelo governo brasileiro indica que persistem elementos que distorcem o comércio internacional do algodão na nova lei norte-americana", diz um trecho da nota divulgada nesta quarta à noite pela Camex.

Segundo Figueiredo, apesar da nova ação na OMC contra os EUA, o governo brasileiro continuará a negociar ativamente com Washington a solução definitiva para essa questão. Por enquanto, acrescentou o ministro, é preciso saber se a lei agrícola está de acordo com o que foi determinado:

— O que nos interessa, mais do que tudo, é resolver a questão e que o resultado seja ótimo para os interesses nacionais. Portanto, vamos negociar com os EUA para termos a solução final.

Para o presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), Gilson Pinesso, o setor continuará sendo prejudicado pelos programas de incentivos dos EUA. Ele disse que, embora os cotonicultores defendessem a retaliação imediata, a categoria acatará a decisão da Camex e dará todo o apoio.

— Os ministros da Camex ponderaram que agora existe uma nova lei que precisa ser analisada. Mas vamos provar, na OMC, que os americanos continuam infringindo as normas internacionais de comércio — afirmou.

Até a aprovação da nova lei agrícola americana, no mês passado, a retaliação aos EUA era dada como certa. Alegando impedimento orçamentário, o governo americano interrompeu o repasse mensal aos produtores brasileiros de algodão, como parte de um acordo firmado pelos dois países há três anos. Os EUA devem em torno de US$ 60 milhões e ainda não disseram como vão pagar.

Na época em que o acordo foi firmado, há cerca de três anos, os EUA se comprometeram a repassar US$ 147,3 milhões por ano aos produtores brasileiros de algodão. Também prometeram reduzir os subsídios às exportações e acelerar o processo de reconhecimento de Santa Catarina como estado livre de febre aftosa.

Pelo descumprimento do acordo, a retaliação à qual o Brasil está autorizado abrange não apenas a parte comercial, com o aumento de tarifas de produtos importados dos EUA. Outra vertente está na área de direitos autorais, o que inclui patentes de medicamentos, sementes, livros e outros itens culturais.

Para a pesquisadora do Ibre/FGV e professora da Uerj Lia Valls Pereira, o Brasil está correto em recorrer à OMC:

— Os EUA tinham se comprometido a pagar (a compensação aos produtores brasileiros de algodão), pararam de pagar e ainda fizeram nova lei agrícola. É natural que o Brasil busque a OMC, faz parte do jogo.

Retaliar pode ser tiro no pé

Lia lembra que uma nova corrente de pensamento já defende que os países sejam obrigados a pagar multas no caso de subsídios, e não apenas seja dado às partes prejudicadas o direito de retaliação.

— No caso do Brasil, pode ser que acabe perdendo mais com a retaliação aos Estados Unidos. É preciso ter cuidado para não prejudicar outros setores.

O novo impasse entre Brasil e EUA ocorre no momento em que programas de incentivos fiscais brasileiros poderão ser alvo de um painel a ser solicitado pela União Europeia (UE). Entre os incentivos questionados estão o regime automotivo brasileiro, os benefícios tributários para notebooks, tablets e smartphones e até mesmo a Zona Franca de Manaus, criada há quase 50 anos. Ao mesmo tempo, Brasil e Mercosul negociam com a UE. Esse assunto e a ameaça europeia aos incentivos brasileiros serão discutidos no próximo dia 24, em Bruxelas, em reunião de cúpula entre a presidente Dilma Rousseff e líderes da região. (Colaborou Lucianne Carneiro)

Fonte: O GLOBO

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