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sexta-feira, 13 de julho de 2018, 7h47

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Abrapa leva professores de moda, design e belas artes para conhecer o processo produtivo do algodão

Professores e coordenadores de cursos de moda, design e belas artes de cinco das mais importantes universidades de São Paulo deixaram, na quarta-feira (11/07), a sala de aula para conhecer in loco de onde vem, como é produzida, processada e classificada a mais importante matéria-prima utilizada pela indústria têxtil em todo o mundo, o algodão. […]

Professores e coordenadores de cursos de moda, design e belas artes de cinco das mais importantes universidades de São Paulo deixaram, na quarta-feira (11/07), a sala de aula para conhecer in loco de onde vem, como é produzida, processada e classificada a mais importante matéria-prima utilizada pela indústria têxtil em todo o mundo, o algodão. A iniciativa foi promovida pela Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), na fazenda Pamplona, propriedade do Grupo SLC Agrícola, localizada a 90km de Brasília. A última parada da expedição foi na sede da associação, na Capital Federal, onde também está o Centro Brasileiro de Referência em Análise de Algodão (CBRA), laboratório central de classificação instrumental da fibra. A aproximação com a academia é parte da estratégia do movimento Sou de Algodão, lançado pela Abrapa em 2016 para estreitar o relacionamento entre os elos da produção e do consumo na cadeia produtiva da fibra no Brasil, e, consequentemente, incrementar o mercado nacional.

 

Faculdade Santa Marcelina, Fundação Álvares Penteado (FAAP), Istituto Europeo Di Design (IED), Belas Artes, e Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) foram as instituições que participaram da expedição, batizada pela Abrapa de Cotton Trip. Nenhum dos 16 acadêmicos presentes conhecia uma fazenda de algodão típica da moderna cotonicultura, que vem sendo praticada no cerrado desde o final da década de 80, conhecidas como “verdadeiras indústrias a céu aberto”.

 

O grupo foi ciceroneado pelo presidente da Abrapa, Arlindo de Azevedo Moura, e pelo diretor de RH e Sustentabilidade da SLC Agrícola, Álvaro Dilli, que contextualizaram a cotonicultura na produção agrícola do cerrado, com ênfase na sustentabilidade, no status alcançado pelo Brasil na produção e na exportação da commodity, assim como na liderança mundial do país em produtividade sem uso de irrigação. De acordo com Moura, o Brasil vai colher dois milhões de toneladas na safra que está em curso (2017/2018), dos quais 700 mil toneladas abastecem o mercado interno, atendendo completamente à demanda nacional, e o restante é exportado, principalmente, para os países da Ásia.

 

“Já nesta safra, devemos ultrapassar a Austrália, tornando-nos o segundo maior exportador mundial. Há ainda muito potencial para o Brasil, que produz sem necessidade de subsídios governamentais e sem depender de irrigação, ao contrário do que acontece com dois de nossos grandes concorrentes, respectivamente, os Estados Unidos e a Austrália. Por isso, nos baseamos na sustentabilidade para avançar e consolidar as nossas posições”, afirma o presidente da Abrapa.

 

A sustentabilidade – ambiental, econômica e social – foi uma das linhas-mestras das apresentações que precederam as visitas dos professores nas diversas áreas da fazenda, desde a lavoura à usina de beneficiamento, passando pelas áreas administrativas e de convivência. A Pamplona é certificada pelo programa Algodão Brasileiro Responsável (ABR), da Abrapa, e licenciada pela Better Cotton Initiative (BCI). No Brasil, a Abrapa e a ONG suíça BCI operam em benchmarking. O país responde por 30\% de toda a fibra licenciada pela BCI no mundo, sendo o líder global em fornecimento de algodão sustentável.

 

Por conta da logística, adaptada para concentrar as atividades em um único dia, o circuito percorrido pelos professores na fazenda não foi linear. O grupo conheceu primeiro a usina de beneficiamento da Pamplona. Lá, o algodão colhido nas lavouras chega em fardos cilíndricos, que são desfeitos para que os capulhos sejam descaroçados, e o algodão separado em subprodutos. A usina da Pamplona tem capacidade para processar, em média, 40 fardos por hora, o que resulta em, aproximadamente, 65 mil fardos por safra. A parada seguinte foi a sala de take up, onde é feita a classificação visual do algodão, com destaque para as suas características extrínsecas, como a cor. Os visitantes puderam tocar a pluma beneficiada e compará-la às amostras contidas nas caixas-padrão do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA). A visita à lavoura foi um dos pontos altos da programação.

O coordenador da Belas Artes, Fernando Puccetti Laterza, se disse impactado com tudo o que viu. “Não imaginava como era o processo produtivo do algodão no campo. Além disso, ter o contato com a terra, com o sol, sentir os cheiros, ver as emas no meio da lavoura, ver os pássaros comendo as sementes, a mão de obra operando, me ajudou a ter uma dimensão do processo todo. Vou passar ainda muito tempo digerindo tudo o que vi e ouvi. Foi muito rico e intenso”, conta. Já no Centro Brasileiro de Referência em Análise de Algodão (CBRA), em Brasília, o grupo aprendeu sobre as características intrínsecas do algodão, aferidas pelo High Volume Instrument (HVI), tecnologia que mensura com precisão aspectos como finura, cumprimento, resistência, reflectância, micronaire, dentre outras.

 

Invertendo a curva

Em sua apresentação, o diretor de RH e Sustentabilidade da SLC, Álvaro Dilli, destacou que as características do algodão, como o fato dele ser natural, aconchegante, antialérgico e agradável ao toque, eram responsáveis pela participação de 70\% da fibra nas roupas da população brasileira nos anos de 1970. “Sintéticos e artificiais ficavam com 30\%. Nos anos recentes, essa relação se inverteu. Mas a conscientização do consumidor para a sustentabilidade tem gerado uma demanda importante, que está começando a reverter esse quadro”, afirmou.

 

Segundo o coordenador do bacharelado de moda da Faculdade Santa Marcelina, Nelson Kume, a grande participação dos tecidos sintéticos no guarda-roupas das pessoas vem de aspectos como praticidade e preço, e também de uma suposta aparência de glamour. “O sintético tem um aspecto visual que remete a uma certa riqueza, ao chique, por causa do brilho e da textura do poliéster. Mas a tecnologia traz novos tipos de beneficiamento, e até de constituição de matéria têxtil. Com o tempo e pesquisa, vai-se conseguir incorporar essas características no algodão. Hoje há alguns efeitos muito interessantes, como jeans e brim resinados, mas pode-se desenvolver muito mais”, ponderou.

 

Teoria e prática

 

Nelson Kume relata que, quando foi convidado a participar da expedição, sua preocupação era sobre como lidar com os dois extremos da cadeia produtiva: usuários de produtos têxteis e produtores de fibras. “O que mais me surpreendeu foi o nível de planejamento e organização desse empreendimento e do setor. Não imaginava que eram tão bem estruturados e evoluídos em termos de tecnologia”, relata. Ele diz estar pensando nas formas de levar isso aos seus alunos e à instituição e, também, que a visita o fez refletir sobre a importância que, no Brasil, se dá às coisas vindas de fora. “Na visita, a gente percebeu que é o momento de criar a cultura da autovalorização”, concluiu.

Para Marco Antonio Andreoni, professor de design de moda da Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP), ver o processo de produção da matéria-prima dá ao profissional de moda a dimensão real da viabilidade de uma ideia. “Você adquire uma noção das distâncias e está vendo as coisas acontecerem. Esse contato direto é muito mais esclarecedor e volta para o processo criativo, porque você entende o encadeamento de aspectos que que geralmente estão ausentes quando se tem uma ideia, tornando-a muito mais factível; as dúvidas ficam menores. Então, seu projeto vai precisar de menos ajustes, o que diminui os tempos e resulta em muitos ganhos”, ele explica. “A fazenda é uma indústria que cuida da matéria-prima. Nunca tinha visto igual. Ir até a origem faz toda a diferença”, afirma.

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